Viviam-se dias difíceis. De angústia delongada, com exacerbação recente indisfarçável nos rostos dos semelhantes. Noites mal dormidas que espontavam em humores precários. Tudo em jogo. O real e o hipotético. O presente e o futuro. As prioridades mais retalhadas que no matadouro. E ainda antes dos golpes, rotulá-las: geografia, vida familiar, riqueza, qualidade de vida, estado, privada, especialidade, renome, instituição... A lista era extensa. Carente de ordenação. E exigiam-se poderes divinatórios. No limite, do resto das suas vidas. No outro extremo, talvez de uma dúzia de revoluções lunares. E a imprevisibilidade desse mesmo limite. A contingência de tudo.
quarta-feira, dezembro 06, 2006
segunda-feira, dezembro 04, 2006
Black magic
Há coisa de umas semanas, caí sob o feitiço de uma voz... Na verdade, de duas. Mas só esta canta.
E como canta!...
Shara Worden - Golden Star
terça-feira, novembro 28, 2006
Crónicas de uma partida an[un]siada #2
Todos os dias planeava levar a máquina fotográfica, no dia seguinte, na mochila. E todos os dias saía sem ela. Mas as suas duas objectivas castanho-esverdeadas sobejavam em lentes, eram rápidas no disparo e tinham memória de vários gigas.
Crónicas de uma partida an[un]siada #1
Ultimamente, vagava a cidade na ambivalência: nunca ter amado tanto essas ruas que lhe pertenciam por direito de nascença, e estar já apartada delas como por uma cortina de vidro que permitisse ver, mas não tocar.
Oscilações
O medo. O desejo de precipício. E o medo. E o desejo de precipício. De novo, o medo. Na volta, o desejo de precipício. Insistentemente, o medo. Persistentemente, o desejo de precipício.
domingo, novembro 26, 2006
Pastelaria
Afinal o que importa não é a literatura
nem a crítica de arte nem a câmara escura
Afinal o que importa não é bem o negócio
nem ter o dinheiro ao lado de ter horas de ócio
Afinal o que importa não é ser novo e galante
- ele há tanta maneira de compor uma estante!
Afinal o que importa é não ter medo: fechar os olhos frente ao precipício
e cair verticalmente no vício
Não é verdade, rapaz? E amanhã há bola
antes de haver cinema madame blanche e parola
Que afinal o que importa não é haver gente com fome
porque assim como assim ainda há muita gente que come
Que afinal o que importa é não ter medo
de chamar o gerente e dizer muito alto ao pé de muita gente:
Gerente! Este leite está azedo!
Que afinal o que importa é pôr ao alto a gola do peludo
à saída da pastelaria, e lá fora - ah, lá fora! - rir de tudo
No riso admirável de quem sabe e gosta
ter lavados e muitos dentes brancos à mostra
nem a crítica de arte nem a câmara escura
Afinal o que importa não é bem o negócio
nem ter o dinheiro ao lado de ter horas de ócio
Afinal o que importa não é ser novo e galante
- ele há tanta maneira de compor uma estante!
Afinal o que importa é não ter medo: fechar os olhos frente ao precipício
e cair verticalmente no vício
Não é verdade, rapaz? E amanhã há bola
antes de haver cinema madame blanche e parola
Que afinal o que importa não é haver gente com fome
porque assim como assim ainda há muita gente que come
Que afinal o que importa é não ter medo
de chamar o gerente e dizer muito alto ao pé de muita gente:
Gerente! Este leite está azedo!
Que afinal o que importa é pôr ao alto a gola do peludo
à saída da pastelaria, e lá fora - ah, lá fora! - rir de tudo
No riso admirável de quem sabe e gosta
ter lavados e muitos dentes brancos à mostra
Nobilíssima Visão, Mário Cesariny
Mário Cesariny [1923-2006]
O Riso Útil
o riso útil da amorosa
retine de tal maneira
no pobre quarto cor-de-rosa
que as tuas mãos de senhor
já não sabem por que milagre
ainda é puro o amor
o riso útil da amorosa
retine de tal maneira
no pobre quarto cor-de-rosa
que as tuas mãos de senhor
já não sabem por que milagre
ainda é puro o amor
Manual de Prestidigitação, Mário Cesariny
quarta-feira, novembro 22, 2006
Frase do dia
- Sabe, Dra., eu ando à procura do homem dos 3 oitos: 80 anos, 800 mil contos e 8 dias de vida!
Ela, viúva, de 67 primaveras e sorriso ladino.
sábado, novembro 18, 2006
Quando o céu e a terra se tocam
Hoje percebi que se tocam. O céu e a terra. Ligam-se por pontes aquosas. Para interromper a distância estival. Mais agora, no tempo frio. As nuvens iniciam o pranto, cadenciado o primogénito, taquicardíaco o que lhe segue. Quantas vezes, torrencial. De ritmo e magnitude ditadas pela urgência da saudade. Com o solo a acolchoar a queda, amante silente e atento, em jeito de afago redentor.
Tocam-se, dizia. A terra e o céu. Quando chove.
sexta-feira, novembro 17, 2006
domingo, novembro 12, 2006
Metaphorically speaking
Disse-me que, para ele, o Porto era uma puta. Mas no sentido literário do termo.
sábado, novembro 11, 2006
MostrEM - parte 2
Estuda o Harrison de fio a pavio
autopsia-me com minúcia
passa-me na gama-câmara
exclui-me a glomerulonefrite
extirpa-me o glioma
atende-me na via verde do AVC
faz-me o TC cerebral
vê-me o fundo de olho.
Se preciso, dois ou três ciclos de quimioterapia
a reparação da ruptura do LCA do joelho direito
ou mesmo o exame do cavum.
Pede-me é toda a bateria de análises
não vá eu ter um parainfluenza mal estudado
e depois precisar de consultas de acompanhamento de adolescentes.
O Rx tórax (como deixar de fazê-lo?)
o antidepressivo (como deixar de o prescrever?)
a ecografia abdominal (mas só até às 10h30 da noite)
a radioterapia (esta, só para alguns).
Se ainda assim estiveres às escuras, mais vale pedir uns ANA.
O importante é a saúde da comunidade
e as consultas de infertilidade.
terça-feira, novembro 07, 2006
Alexander Bell e tubos de ensaio
As palavras - acompanhadas, escritas, lidas, trocadas - tinham agora uma voz. As palavras e algumas escassas imagens (tinham agora uma voz). Adquiriram compasso, timbre, entoação, pronúncia. Todos de características diferentes do imaginado.
Era quase como uma reacção química - em que a mistura dos reagentes dá origem a algo previamente inexistente - cor, cheiro, nova substância... Aqui era a voz.
Agora só faltava a voz ganhar corpo.
domingo, novembro 05, 2006
sexta-feira, novembro 03, 2006
MostrEM - parte 1
Estende-me numa lâmina
injecta-me o propofol
toma-me o pulso
corrige-me a transposição dos grandes vasos
transplanta-me um pulmão
ou até mesmo um fígado.
Faz-me depois uma mamoplastia
corrige-me o pé boto
põe-me um stent endovascular
trata-me a couperose a laser
prescreve-me 12 U de insulina
faz-me a hemostase da epistáxis
submete-me a uma EDA
testa-me o DNA
assiste-me no parto e faz-me a episiotomia
pede-me o hemograma
e também as IgEs
transfunde-me 2 UGR.
Dá-me é o antibiótico.
Põe-me a fazer cinesioterapia.
Mas passa-me o P1.
injecta-me o propofol
toma-me o pulso
corrige-me a transposição dos grandes vasos
transplanta-me um pulmão
ou até mesmo um fígado.
Faz-me depois uma mamoplastia
corrige-me o pé boto
põe-me um stent endovascular
trata-me a couperose a laser
prescreve-me 12 U de insulina
faz-me a hemostase da epistáxis
submete-me a uma EDA
testa-me o DNA
assiste-me no parto e faz-me a episiotomia
pede-me o hemograma
e também as IgEs
transfunde-me 2 UGR.
Dá-me é o antibiótico.
Põe-me a fazer cinesioterapia.
Mas passa-me o P1.
quarta-feira, novembro 01, 2006
segunda-feira, outubro 30, 2006
Manic Monday
Na rádio passava a música das Bangles. Mas era mentira. Não havia sequer o tráfego costumeiro que justificasse qualquer atraso na entrada ao serviço. Às 14:13h a cidade mantinha-se silenciosa. Adivinhavam-se artigos e baixas a rondar o feriado. Até o vento estava de folga. O ar pesava nos brônquios. As gaivotas delineavam os telhados. A tempestade impregnava os corações.
sábado, outubro 28, 2006
Last Nomads of Rajasthan
Mal se entrava na sala, o cheiro a incenso. Um painel no palco. A atmosfera estava pronta. Gostei muito. Vibrei mesmo! Do início ao fim, não parei na cadeira. Houve quem saísse a meio. Mas ficou quem gostava. Os trajes multicolores. Os cantares do deserto de Thar. Os tambores, os guizos, as facas, o gingar dos corpos. A música não era só o som; era também movimentos e vestes. Gostei. Muito.
segunda-feira, outubro 23, 2006
Sol de Outubro
El sol de octubre ciñe
al paisaje maduro.
Otorga a lo que vive
su plenitud de fruto.
El aire se hace de oro,
se enjoya de susurros,
panal de los dulzores,
reino del ritmo puro,
melodía de flauta
que derrumba lo oscuro,
entra por la ventana,
dibuja desde el júbilo
seres con sosegada
vocación de desnudo,
criaturas del gozo
que llegan de otro mundo.
al paisaje maduro.
Otorga a lo que vive
su plenitud de fruto.
El aire se hace de oro,
se enjoya de susurros,
panal de los dulzores,
reino del ritmo puro,
melodía de flauta
que derrumba lo oscuro,
entra por la ventana,
dibuja desde el júbilo
seres con sosegada
vocación de desnudo,
criaturas del gozo
que llegan de otro mundo.
Cuaderno de Nueva York, José Hierro
domingo, outubro 22, 2006
quinta-feira, outubro 19, 2006
Things are lookin' up...
O mapinha saiu melhor que as previsões. Há mesmo quem diga que é bom. Resta saber quando se traçam as rotas. Nestas estradas, embora as SCUTs com portagem ou sem ela também possam importar, jogam-se valores mais altos.
terça-feira, outubro 17, 2006
segunda-feira, outubro 16, 2006
Rasganço
Visitar a cidade durante a sua ausência era como folhear as páginas de um diário de memórias, às escondidas. E essa ideia imprimia-lhe um sorriso nos passos e uma curiosidade no olhar.
sexta-feira, outubro 13, 2006
Pinky clássica
Ele diz 1949. No meu B.I. figuram algarismos diferentes nas dezenas e nas unidades.
O melhor mesmo é fazer a datação com carbono 14, para tirar teimas.
terça-feira, outubro 10, 2006
Imoral(terceira)idade dentro de quatro paredes
Entrou, despachada, no consultório. Setenta e dois anos, boas cores, óptimo estado geral. Queixas? As do costume. Do costume, para quem tem patologia osteodegenerativa da coluna. Não fosse o diagnóstico e os resultados das TCs anteriores estarem escritos no processo da doente, e não se adivinhava só de olhar.
Mediu-se a tensão, auscultou-se, renovaram-se as receitas. E a conversa vai fluindo. Conta a senhora que procura um trabalho. Emprego não, que já não tem idade para isso. Mas um trabalho. Para ter desculpa para não estar todo o dia encafuada em casa, mas sobretudo para ganhar algum dinheiro. Vive com o único filho, nora e neto que já frequenta o secundário. É ela que cozinha, limpa, lava a roupa e engoma para todos. Não escuta sequer uma palavra meiga. Um agradecimento. Fica sempre de fora das férias familiares. E ainda põe dinheiro (uma vintena dos antigos contos) para as despesas da casa. E teve parcos dias estipulados para ir chorar a morte da irmã, aqui há tempos. Que o serviço da casa não podia ficar por fazer. É a nora, diz. Detesta-a. Aguenta-a pelo filho. Pelo neto.
Eu e minha colega entreolhámo-nos. Aconselhámo-la a procurar talvez uma distracção, fazer companhia a pessoas idosas e doentes, grupos de actividades culturais, lembrámos que esforços exagerados poderiam piorar uma situação clínica estável e controlada, indicámos-lhe algumas instituições e grupos... Ela disse que já tinha pensado nisso... Mas não podia estar fora de casa muitas horas. Ai, se eu não faço o serviço!... Prometeu pensar sobre o assunto. No entanto, depois de se despedir, enquanto fechava a porta, ainda nos lançou a pergunta:
- Mas como é que eu, assim, me torno independente?
sexta-feira, outubro 06, 2006
Maleita s.o.e.
Órgãos fortalecidos (músculos, então! os tríceps já aguentam com 40 repetições de 3 Kg cada), visão turva (é das lentes de contacto que já passaram da validade; já encomendei 2 caixas), noites pensativas e despertas (os programas mais interessantes só passam na TV a altas horas). Resistir com um nadinha de esperança. Mas, eu por mim, vou persistindo insistentemente. Nessa coisa de encerrar conscientemente um passado consumado.
segunda-feira, outubro 02, 2006
Esta semana
4 lugares: Batô, Guarany, ginásio, Bonaparte
4 tempos: 25 anos, 12 anos, 1 mês, 5 meses
4 sabores: café, água tónica, bolachas de canela, chocolate preto
4 leituras: Relatório de Actividades 2005 da Unidade de Saúde dos Guindais, O Cego de Sevilha, Os Indiferentes, Revista Xis de 23 Set
sexta-feira, setembro 15, 2006
A vidente
Esta tarde, quando ia de carro na marginal, um pouco antes de passar debaixo da Ponte da Arrábida, na direcção Ribeira-Foz, vi uma mulher sentada no muro a olhar o rio. Pouco passava das seis da tarde e o céu já vestia de pôr-do-sol. Ao longo desse muro vêem-se sempre vários pescadores, uns solitários, outros em grupo; há sempre gente a correr, de bicicleta, casais amorosos a passear, pares de amigas, turistas. Ela era mulher e estava sozinha, sem parecer esperar ninguém; de pernas cruzadas e cabelos levemente ondulados pelo vento. Hoje o tempo esteve bom, eu levava a janela meia aberta e desejei também fazer parte do cenário. Mas, estranhamente, - pensei de início - a rapariga não estava de costas para os carros a olhar a foz do rio e o poente. Estava de cabeça erguida, voltada para nascente. Não para onde o rio vai, mas de onde ele vem. Para o princípio. Depois entendi. Tinha os olhos bem abertos e a face serena. Estava a aprender a lição. A ouvir a verdade contada pelo cristal líquido. Fitando a direcção contrária. Quando todos olham o desaguar das águas. Fui a pensar nisto o resto do caminho. Achei uma atitude sábia. Também a mim me atraem agora os começos. De tudo. Os fins foram lá atrás.
quarta-feira, setembro 06, 2006
sexta-feira, setembro 01, 2006
Cartas
Cartas. De papel. E com cheiro. A rosas ou a outro perfume suave. Sobretudo as de amor. E porque não as de amizade?, havia conjuntos de cartas e envelopes lindos, com desenhos, odores, e relevos e recortes, escrevi muitas a amigas minhas e lembro-me também de as receber. Coleccionavam-se. Mas, sobretudo, as de amor. Devem ter sido descontinuadas. Hoje em dia isso acontece a muitas outras coisas. Outro dia rompi a pulseira de couro do meu relógio e fui à loja comprar outra. Não havia. Tinha sido descontinuada. Tiveram que enviar o mostrador para a marca. Lá me resolveram o problema. Esperei 3 meses. Andei sem relógio. Perdi a noção do tempo. Mas ontem vi um filme onde havia uma casa sobre um lago. Ou lagoa. E cartas. Muitas. E já me decidi. Acho que vou começar a escrever cartas. Em papel. E a deixá-las numa caixa de correio. A ver o que acontece. Perdi a noção do tempo. Pode ser que aconteça algo. Quem sabe o amor. Não tenho é destinatário. Penso. Primeiro tenho que alugar uma casa no lago. Vivo perto do mar. Bolas! Bolas, não. Cartas.
sexta-feira, agosto 25, 2006
Ironias do Blogger
Pior: não é que quando escrevo o mail no post, ele cria um link, e quando o quero pôr no template, não consigo?!
Acredito que isto tem certamente uma explicação muito simples. Mas que eu desconheço. Desconfio, no entanto, que tem a ver com linguagens HTML e coisas afins. Um mimo. E eu que pensei que a versão Beta era para descomplicar...
Andanças do Blogger
Quem percebe pouco destas coisas é assim. Estava ainda a saborear a minha vitória de ter conseguido actualizar o blog, passando-o à versão Beta, e já desanimo ao ver que não consigo pôr assim ali no cantinho superior direito o meu mail, sim, daqueles com link, em que se carrega e o editor de correio electrónico começa a funcionar...
P.S.: Aceita-se ajuda de blogger caridoso. E para quem estiver interessado, a morada mantém-se: pink4mail@yahoo.com.br
terça-feira, agosto 22, 2006
Breakthroughs em Imunidade humoral
Dados preliminares permitem-me constatar que também se desenvolvem defesas contra as relações amorosas idas. E específicas para o antigénio. E também se produzem IgG, de protecção indefinida (ainda meramente uma hipótese).
Pelo sim, pelo não, vou continuar a fortalecer o meu sistema imune com períodos de exposição moderada ao sol e banhos de mar, nas iodadas praias nortenhas.
segunda-feira, agosto 21, 2006
Chavões de Enfermaria
- Quem foi o médico que prometeu uns exames ao doente da cama 13?
- Ao senhor M.? Fui eu, Sr. Enfermeiro. Mas quem o ouvir dizer isso... O homem vai mesmo fazer um Rx tórax, já está pedido e até já liguei para os técnicos lá em baixo. Os mensageiros é que nunca mais aparecem para levar o doente.
- Ai, Doutora, Doutora... É que o homem nunca mais se cala a perguntar quando é que vai fazer o exame. É que sabe, os doentes são como as mulheres: não se lhes pode prometer nada.
sábado, agosto 12, 2006
domingo, agosto 06, 2006
Agosto
O calor. A esplanada ao fim da tarde. Ou o pequeno-almoço na esplanada deserta. Chegar a horas ao trabalho. Usar pouca roupa por baixo da bata. A cidade que foi de férias. Desculpa para a moleza pós-laboral.
domingo, julho 23, 2006
terça-feira, julho 11, 2006
"D resto nada de novo hehe"
Assim, tal e qual. Era assim que terminava a mensagem de telemóvel. Não pude deixar de esboçar um sorriso. Ainda bem. Ainda bem que não há nada de novo e ainda bem que o nevo era benigno.
Para o senhor E.A., na casa dos 60, essa seria a melhor coisa que lhe poderia acontecer. Isso, de não haver nada de novo. Mas para ele não foi assim. Entrou com uma erisipela nos membros inferiores e saiu com uma doença nova, que infelizmente não terá a boa evolução da erisipela e não passará certamente com antibiótico. Ao senhor E.A., essas criaturas que o examinam todos os dias na enfermaria, diagnosticaram-lhe um Linfoma de Células do Manto. Mas o senhor E.A. é um homem simples, que nos questiona repetidamente antes de cada exame marcado se terá de pagar alguma coisa para o fazer e que todos os dias nos lembra de pedirmos transporte de ambulância quando tiver alta, e o senhor E.A. todos os dias nos recebe com um sorriso e está contente com o seu novo pacemaker, a "pilha" que faz o coração bater certinho e melhor. Sim, tratadas que estão a erisipela e a FA com bradicardia e o bem que se sente agora o senhor E.A., poder-se-ia pensar que tudo estivesse bem. Mas não, há algo de novo: o maldito LNH, a maldita translocação t(11;14) e os números que não enganam: cerca de 25% de sobrevida aos 5 anos. E agora, agora que o senhor E.A. estava pronto para voltar de vez à sua terra, vai ter de voltar umas poucas de vezes para fazer um tratamento duro, intensivo e que lhe vai oferecer muito pouco. É isso mesmo, muito pouco, não vai servir para extirpar essa coisa "nova", essa coisa "ruim" que ele ainda não sente, mas que já começa a dar sinais de si. É a dura realidade do senhor E.A., uma realidade que ele não entende completamente, como homem simples que é, mas que não engana e está aí: mau prognóstico. Pela neoplasia que é, pela idade do doente e pelo estadio avançado em que está.
E é assim: a Medicina irá tentar, mais uma vez, empurrar a linha, atrasar o desfecho, é isso que sabemos fazer hoje melhor que ontem, e esperar para ver o que a Natureza nos reserva. De qualquer das formas, uma coisa é certa: para o senhor E.A. (e para os seus cuidadores) era melhor que, de resto, não houvesse nada de novo.
segunda-feira, julho 10, 2006
sexta-feira, junho 30, 2006
Progress notes
S: Bem-disposta. Animada. Sem queixas de novo (e a esquecer as antigas).
O: Vigil, consciente e colaborante. Orientada para tempo, espaço e pessoa.
Bom aspecto geral. "Ruiva". Sorridente, unhas pintadas de vermelho vivo.
Mucosas coradas e hidratadas. Anictérica e acianótica. Sem SDR.
Hemodinamicamente estável. Taquicárdica. Apirética.
AC: "lub dub, lub dub"...
AP: MV presente e simétrico, sem ruídos adventícios.
Abdómen: plano,mole e depressível, sem SIP, indolor à palpação superficial e profunda, sem organomegalias, RHA + e N.
Membros inferiores: depilados.
A: Melhoria sintomática. A taquicardia deve-se à antecipação do fim-de-semana. No que concerne à orientação espacial é de acrescentar que não foi ela a responsável pela elaboração do roteiro (embora, caso tivesse sido, não resultaria grande prejuízo).
P: Aproveitar bem o fim-de-semana. Tracto GI preparado para ingestão de paellas, tapas, cañas e afins. 2a-feira é previsível o surgimento de algum cansaço (após noite de SU), mas este cederá certamente a umas boas horas de sono.
O: Vigil, consciente e colaborante. Orientada para tempo, espaço e pessoa.
Bom aspecto geral. "Ruiva". Sorridente, unhas pintadas de vermelho vivo.
Mucosas coradas e hidratadas. Anictérica e acianótica. Sem SDR.
Hemodinamicamente estável. Taquicárdica. Apirética.
AC: "lub dub, lub dub"...
AP: MV presente e simétrico, sem ruídos adventícios.
Abdómen: plano,mole e depressível, sem SIP, indolor à palpação superficial e profunda, sem organomegalias, RHA + e N.
Membros inferiores: depilados.
A: Melhoria sintomática. A taquicardia deve-se à antecipação do fim-de-semana. No que concerne à orientação espacial é de acrescentar que não foi ela a responsável pela elaboração do roteiro (embora, caso tivesse sido, não resultaria grande prejuízo).
P: Aproveitar bem o fim-de-semana. Tracto GI preparado para ingestão de paellas, tapas, cañas e afins. 2a-feira é previsível o surgimento de algum cansaço (após noite de SU), mas este cederá certamente a umas boas horas de sono.
terça-feira, maio 23, 2006
As palavras que nunca te direi
Nunca te cheguei a revelar um hábito meu, um ritual que cumpria sempre que estava em casa, ao entardecer, desde que o Inverno tinha partido. Encostava-me ao parapeito da janela do quarto (sim, aquela janela rasgada) e, em silêncio ou com a música a tocar, ficava a ver o pôr-do-sol e a sorrir sozinha, de felicidade e gratidão, por te ter. Era um momento em que revivia peripécias nossas... tecia sonhos...
É por isso que, agora que tudo acabou, os pores-do-sol me são difíceis.
segunda-feira, março 20, 2006
Em estreia desde Janeiro de 2006 (e, esperemos, até aos 65, mais coisa menos coisa...)
A saúde do meu doente será a minha primeira preocupação.
terça-feira, dezembro 27, 2005
O costume, se faz favor!
Era só para deixar a mensagem do costume, na quadra do costume, com as palavras do costume (o sentimento é que é renovado):
a
Feliz Natal e um óptimo 2006
sábado, dezembro 10, 2005
Favourite places
Ultimamente, o meu sítio preferido é dentro do teu abraço, com vista para o interior do teu olhar.
quinta-feira, outubro 27, 2005
Das partidas e dos regressos
Sempre gostei mais das partidas. Das minhas, entenda-se. E dos regressos. Neste caso, do dos outros. Dos que fazem falta. E tu tens feito bastante.
E desta vez estou com sorte. Estás de regresso e eu de partida. Mas sem desencontros!
Mas para já vou ficar a degustar a palavra partida, qual quadrado de chocolate negro a derreter lentamente na minha boca... Par-ti-da...
segunda-feira, outubro 24, 2005
De regresso
Aos blocos de cimento. Ao trânsito. Aos STCP. E agora ao Metro. Ao aquecimento central. Ao hi-fi. À televisão. Ao computador. À Internet. Ao telefone fixo.
... ...
Ok, pronto, salva-se o aquecimento central!
Mas já tinha saudades do buliço da cidade...
quinta-feira, setembro 15, 2005
Nenhum Olhar
Tenho o peso do mundo sobre as costas. O sol põe-se no mar, ao fundo da Av. da Boavista, e cá dentro as sombras também crescem. Algo morre. Um pouco mais. Sou eu. Sou eu que morro um pouco mais. Espero, ao menos, que a primeira parte do vaticínio se tenha já cumprido. Caso contrário, duvido que resista muito mais. Resta-me esperar pelo futuro.
Entretanto, vou ficando com aquela que me parece hoje a única verdade, de José Luís Peixoto:
Já não posso voltar atrás, porque nunca se pode voltar atrás. Só o arrependimento daquilo que não escolhemos persiste, existe.
segunda-feira, junho 20, 2005
Mycobacterium praiae
Sabe bem decorar os esquemas terapêuticos dos antibacilares ao som das rolas insistentes. Ou adormecer, depois de estudar a tuberculose, com a areia da praia a transpirar maresia. Quem dera que a febre vespertina do sol do Verão e o emagrecimento das tristezas invernosas fosse multirresistente e se demorasse no meu corpo durante os próximos meses...
sábado, maio 14, 2005
Morada à beira-mar
Nos próximos tempos não me encontrarão aqui. Estarei a pisar o areal a perder de vista, quase intocado nesta época do ano, sobre o qual baila, no jogo do tapa-e-destapa, esse imenso véu azul-prata. Estarei lá, onde as manhãs cheiram a maresia e às hortênsias da minha mãe. Lá, onde os pássaros escondem o seu ninho no interior da sebe que escala o muro. Onde o comboio que transporta essa massa humana dos subúrbios é o que me separa e liga à cidade. É lá que estarei. Mas talvez até venha postar mais vezes. Talvez vos venha contar os segredos dos búzios. Lá, é quase garantido que irei escrever mais.
domingo, maio 01, 2005
segunda-feira, abril 25, 2005
1 ano de Pink
Um ano mais cor-de-rosa. Na blogosfera, pelos menos. Na minha vida? Talvez, penso que sim... Quanto mais não seja porque agora tenho a Semiologia feita!
domingo, abril 10, 2005
O teu sms tornado post
Temos de aprender a respeitar as prioridades que sabemos que existem. Viver todos os dias cansa, mas morrer todos os dias cansa muito mais.
espaço
Parabéns! Thank you for always being here.
quinta-feira, março 31, 2005
Desamor e Grécia
Tenho andado ausente. A viver um desamor. Não me tem apetecido falar muito dele. Ontem, por acaso, foi excepção, mas o Blogger não quis que eu postasse. Talvez tenha sido melhor assim. Faltava o teu derradeiro telefonema. Mais uma discussão. A última. Tenho a convicção, de força crescente com o passar das horas, que se falássemos em Grego nos entenderíamos melhor. Assim, realmente, é impossível.
Aliás, fico a rir-me com a ironia do destino. Ontem, quase à hora do jantar, a fazer zapping, deparo-me com um filme no canal Hollywood passado em Santorini. Já não apanhei o título e, infelizmente, não o pude ver até ao fim. Também eu estive na praia de Perissa, fui a Akrotiri, visitei o vulcão e vi aquele pôr-do-sol único no mundo.
Quando falamos os dois, não comunicamos, trocamos somente palavras. É curioso, já vivi situações de comunicação sem haver uma língua, um código comum... Mas haver código comum sem haver comunicação é mais espantoso e frustrante (sim, bem sei que os elementos da comunicação são vários, mas estou apenas a centrar-me naqueles que são diferentes).
Pois é, não dá mesmo. Até porque eu arranho o Grego e tu só falas Português.
segunda-feira, março 07, 2005
Arrumações
Enchi 9 pastas de arquivo morto. As pilhas de fotocópias que já se amontoavam no chão, estão agora no interior de várias capas de lombada larga. O quarto levou uma limpeza geral. Apetece-me escrever, mas não acho as palavras. Certamente foram também deitadas fora, juntamente com os papéis esvaziados do cesto. Quero escrever sobre o filme que fui ontem ver ao cinema, sobre o que sinto por ti e sobre o que li em alguns posts noutros blogues, mas não me sai nada. Será que deitei fora só as palavras, ou, sem querer, esvaziei o coração? Será que as duas coisas que enunciei atrás não são, na verdade, uma só? Será que o meu coração não é senão palavras?!
sábado, fevereiro 19, 2005
Black out sentimental
Isso. Não penses nela. Não fales sobre o assunto. As palavras doem e já esgotaste o paracetamol amoroso. Ocupa as horas com outras tarefas (nestas situações qualquer coisa é válida - define o teu sentido de voto amanhã, por exemplo...). O curativo das feridas sentimentais, das relativamente superficiais e que não necessitam de sutura, não tem segredo: limpa-se com gaze embebida em tempo, desinfecta-se com tintura de silêncio e por cima usa-se um penso de esperança. Depois é só tomar cuidado para não molhar com salpicos de insensatez. Se fizeres assim, vais ver que quando tirares o penso, já passou.
quarta-feira, fevereiro 02, 2005
Castigo
Tive um merecido castigo. Por tentar profanar o que é sagrado.
Tentei introduzir, à socapa, os descrentes no templo. O plano foi por água abaixo... Bem merecido, menina, que te sirva de lição!
Trás-os-Montes é uma Terra Poderosa. Contra aquelas montanhas batem os ventos do litoral e só passam as areias mais finas. Penso que o mesmo acontece com os corações dos forasteiros.
No Mundo Maravilhoso não entra toda a gente. Os badalos dos Caretos, quais espanta-espíritos, afugentam os mal intencionados.
Redutos sacrossantos querem-se como define o adjectivo.
Para lá do Marão... manda a Terra. E ela não quis.
domingo, janeiro 09, 2005
Para pensar
"Tendemos a olhar a vida como um bem inesgotável. E no entanto tudo nos acontece apenas um certo número de vezes, e um número bastante pequeno. Quantas vezes vais lembrar uma certa tarde da tua infância que parece tão fundamental ao teu ser? Umas quatro ou cinco. Talvez nem isso. Quantas vezes irás assistir ao nascer da Lua? Umas vinte. E ainda ssim tudo nos parece não ter limites."
Paul Bowles (Mulheres e Homens, Revista Xis nº 290)
terça-feira, dezembro 28, 2004
Cá dentro
Olho pela janela: lá fora, anoitece.
Em simultâneo, no meu coração, o dia nasce, no que parece ser um amanhecer interminável...
Agrada-me este desfasamento.
Silêncio
Tenho calado as Palavras. Ou elas é que andam mudas.
Não aparecem no papel. Não as encontro no coração.
Talvez andem zangadas comigo. Faltei aos últimos encontros, admito!
Minto... Na verdade, tenho calado as Palavras com medo que elas te invejem...
Por isso, o meu coração vai sussurrar ao teu (para evitar ciumeiras): Adoro-te!
terça-feira, dezembro 14, 2004
Desabafo
Por hoje já chega de auto-comiseração. Já ouvi todas as faixas de músicas depressivas guardadas na minha estante mental propositadamente para estes estados de espírito. Já gastei Kleenex em demasia (Kleenex não, os meus são marca branca Carrefour). Irrita-me este meu desejo de perfeição. Quando não estou à altura, claro! Recordo-me da primeira vez que mo apontaram. Foi uma professora de Ciências Naturais do 8º ano. Escreveu-mo numa dedicatória que tenho, seguramente, algures (já mudei de casa entretanto, mas devo-a ter guardado, eu guardo sempre esse tipo de coisas). Dizia algo do género: Desejo que continues a cultivar o teu perfeccionismo. Senti-me orgulhosa.
E sempre me dei bem com isso. Até há uns tempos. Largos. Em excesso. Nada pior que lidar com o insucesso, sobretudo quando se recusa baixar a fasquia. E eu recuso-me a isso. E depois tenho que me haver com o meu Super-Ego, sempre implacável.
...
Enfim, a dose diária recomendada de sofrimento psicológico auto-infligido já foi atingida (ultrapassada, mesmo!).
Amanhã é um novo dia. Dizem...
domingo, novembro 21, 2004
O jazz da Jacinta
Ontem estive no Casino da Póvoa. Convite para dois, fato escuro, jantar integrado no Festival Gastronómico da Caça: pombo, faisão, coelho bravo, perdiz, veado, javali...
Aceitei ir com o meu pai a este jantar em que fico sentada ao lado de casais na faixa dos 50-60, que praticamente não me dirigem a palavra, a ouvir falar de negócios a noite inteira, só pela Jacinta. Vais gostar, tem boa voz, disse a minha mãe, que já a tinha ido ver com o meu pai ao Rivoli. Fui. Aperaltei-me toda (dentro do informal, não fui de vestido comprido nem nada do género) e preparei-me para morrer de tédio até ao início do espectáculo.
Foi melhor que o previsto: casais na faixa dos 40-50, que me interpelaram por duas vezes e conversas sobre crianças que, na escola, destruiram os estojos dos colegas com uma tesoura e tiveram laranja no comportamento e adolescentes com distúrbios alimentares. A melhorar em relação à última vez que cá estive, pensei.
Foi aí que ela entrou: Jacinta acompanhada de músicos nacionais. A vestimenta era simples (até demais, acho), a atitude humilde, mas gostei da proximidade com o público.
Deixei-me contagiar pelo jazz. Vibrei mesmo. Não estivesse ali e até me levantava para dançar. Os músicos estavam divertidíssimos e eu gosto de espectáculos assim, apetece-me juntar-me a eles.
A actuação não chegou a uma hora, soube a pouco. Mas deixou-me num humor excelente. À medida que o licor era absorvido pelo meu sangue e a música contaminava os meus sentidos, fui sendo invadida pela sensação de que tudo iria correr bem daqui para a frente. Até aquelas baladonas de blues, de uma tristeza alegre, me devolveram uma serenidade que ultimamente não tenho tido. A música sempre teve um efeito muito poderoso no meu estado de espírito.
It was worth it. Agradam-me noites destas. Em que se regressa a casa com a alma a cantarolar uma prece de agradecimento só pelo facto de estarmos vivos...
quinta-feira, novembro 11, 2004
Homicídio premeditado
Sim, acho que o vou fazer. Como diz LGM, o que não se pode resolver, vence-se. E vice-versa.
Vou matar o Amor. Por uns tempos, claro. Não é que o quisesse matar, mas quero enterrá-lo bem fundo, e como não sou uma pessoa cruel custa-me enterrá-lo vivo... Já o matei no passado, então convencida que era de vez, mas ele lá ressuscitou passado uns tempos e julgo, por isso, que a ressurreição é uma propriedade que lhe é inerente. Espero não me enganar. Ao fim e ao cabo, é somente a segunda vez que tento a proeza e, se estiver errada, vou sofrer as consequências do acto para toda a vida (e ainda estou em tenra idade)... Mas acho que vou arriscar. Preciso dele num sítio onde não me incomode, não me perturbe.
Só não sei ainda bem como o vou fazer. Para estas coisas não há protocolos estipulados. Mas talvez comece por deixar de esperar...
quarta-feira, novembro 03, 2004
Sorriso entre as 13:40 e as 14:25
Tive pena que o almoço não tivesse durado mais.
O restante dia não teve mais nada de assinalável.
Só mesmo o teu sorriso contagiante e as boas risadas que demos.
Antes e depois, apenas os livros e a dor surda que não cede completamente à injecção das horas.
Não me interessa dissecar a motivação desse sorriso, o que importa é que há muito que não te via sorrir assim. Deu-me verdadeiro prazer ver esse sorriso.
Foi o momento alto do meu dia.
Ainda bem que não partiste para o Brasil...
O restante dia não teve mais nada de assinalável.
Só mesmo o teu sorriso contagiante e as boas risadas que demos.
Antes e depois, apenas os livros e a dor surda que não cede completamente à injecção das horas.
Não me interessa dissecar a motivação desse sorriso, o que importa é que há muito que não te via sorrir assim. Deu-me verdadeiro prazer ver esse sorriso.
Foi o momento alto do meu dia.
Ainda bem que não partiste para o Brasil...
quinta-feira, outubro 28, 2004
Amizade
Ao J.F.
És as páginas do meu diário secreto
És o eco do meu grito incompleto
És o cofre que guarda as lágrimas dos meus olhos
Como se de preciosos diamantes se tratassem.
És o chilrear dos passarinhos
Que me acorda, de manhã, e me dá os "bons dias".
És a flor, és a pedra do caminho
Que tudo sabe, mas que cala.
És a concha pousada na fina areia da praia,
Que dentro guarda as notas de melodias inéditas.
És a frescura da água das fontes
Que mata a minha sede de viajante fatigado.
És o leito, suave, macio, delicado
Onde me deito, confiante e a sorrir
E onde adormeço, segura, protegida
Sob os lençóis, tão macios!,
De Amizade feitos...
Escrito a 12/03/1997, às 21:45h
O fim de uma pausa prolongada
Decidi, afinal, não te escrever o post que andava a marinar há tempos. Preferi, antes, resgatar um poema (Amizade), que te escrevi há 7 anos (atenta bem na data), e julgo nunca te ter mostrado. Algo pueril, agora, mas sincero como o são os sentimentos na adolescência. Porque, no fundo, foi esse tempo que retomámos este Verão. E ficámos a rir-nos dos caprichos de Saturno, que interromperam a nossa amizade, mas não a quebraram. Porque a Amizade tem esse dom (entre outros): ser capaz de resistir ao Tempo.
Ainda bem. Que assim se preserve.
sábado, outubro 23, 2004
A digestão da mentira
Acabo de confrontar-me com a tua mentira. Agora mesmo. Sem dar tempo ao pensamento, cliquei no Blogger e aqui me encontro, a digeri-la. Sim, é isso que se sente, um baque no peito, uma indisposição gástrica, o cérebro às voltas... Não consigo perceber por que mentiste, mas sei que a tentativa de compreensão do facto me vai ocupar o resto do serão. É certo que assim será. É este o poder da mentira. O baque vai virar dor, a indisposição progredirá para dispepsia franca e o redemoinho de pensamentos culminará em cefaleia. Felizmente, já inventaram os coxibes.
Amanhã estarei de volta.
sexta-feira, outubro 22, 2004
Mais sonhos
Acordei. Dobrei com todo o cuidado o sonho. Dobrei-o quatro vezes.
d
Em Arcas de Sonhos, de Renato Roque
segunda-feira, outubro 18, 2004
Pergunta e resposta
- És uma pessoa apaixonada?
- Sim, sou. Pela vida, em geral, e por ti em particular.
sábado, outubro 16, 2004
Sonhos
As minhas mãos estavam molhadas com o suor do sonho. Cheiravam a mel e a margaridas. Levantei-me da cama e entrei na casa de banho. Abri a torneira da água quente e lavei as mãos. Só água muito quente permite tirar o cheiro de um sonho das mãos. Os restos do sonho soltaram-se quando já não conseguiam suportar a temperatura da água. Vi-os escoarem-se pelo ralo do lavatório. Enxuguei as mãos e levei-as ao rosto. Senti ainda uma réstia de um cheiro a tulipas. Os meus olhos piscaram ao ritmo do bater das asas de uma borboleta. Algumas imagens dispersas cruzaram pela última vez a minha memória.
Em Arcas de Sonhos, de Renato Roque
quarta-feira, outubro 13, 2004
Sensatez - II
Nunca voltes ao lugar
Onde já foste feliz
Por muito que o coração diga
Não faças o que ele diz
Nunca mais voltes à casa
Onde ardeste de paixão
Só encontrarás erva rasa
Por entre as lajes do chão
Nada do que por lá vires
Será como no passado
Não queiras reacender
Um lume já apagado
São as regras da sensatez
Vais sair a dizer que desta é de vez
Por grande a tentação
Que te crie a saudade
Não mates a recordação
Que lembra a felicidade
Nunca voltes ao lugar
Onde o arco-íris se pôs
Só encontrarás a cinza
Que dá na garganta nós
São as regras da sensatez
Vais sair a dizer que desta é de vez
Onde já foste feliz
Por muito que o coração diga
Não faças o que ele diz
Nunca mais voltes à casa
Onde ardeste de paixão
Só encontrarás erva rasa
Por entre as lajes do chão
Nada do que por lá vires
Será como no passado
Não queiras reacender
Um lume já apagado
São as regras da sensatez
Vais sair a dizer que desta é de vez
Por grande a tentação
Que te crie a saudade
Não mates a recordação
Que lembra a felicidade
Nunca voltes ao lugar
Onde o arco-íris se pôs
Só encontrarás a cinza
Que dá na garganta nós
São as regras da sensatez
Vais sair a dizer que desta é de vez
Carlos Tê / Rui Veloso
Sensatez - I
Este post é para ti. Tu também sabes que sim. Não, não te vou repreender, criticar, maçar... Sei bem o que tens passado (tu sabes bem o que tens sentido sobre o que tens passado), mas acho que é preciso recordar-te que, de momento, há esferas da tua vida que precisam da tua dedicação e atenção urgentes e que todas as outras devem ficar em stand by... Faz uma das coisas pelas quais sempre te admirei e em que te considero exímio: racionaliza (acredita, digo isto sem um pingo de crítica e com a maior honestidade). Se não for por ti, fá-lo por mim. Não me desiludas. Dito isto, deixo-te aqui a letra d' As regras da sensatez. Para bom entendedor, uma música basta.
terça-feira, setembro 28, 2004
200 km
Este cair da tarde, cada vez mais outonal, traz-me aquela nostalgia do verão, deste verão... Basta-me fechar os olhos e este calor transporta-me para a temperatura que senti em Trás-os-Montes, para aqueles lugares, para aquelas gentes...
Não consigo. Por mais que tente, não tenho encontrado forma de descrever o que representaram para mim as férias que lá passei... E o mais engraçado é que nem foram verdadeiramente férias, trabalhei todas as manhãs (e algumas noites...), mas nem me apercebi disso. Estas férias foram tudo o que eu precisava, na hora exacta e no local mais-que-perfeito. Agora, à distância da saudade, tudo me parece um sonho. Mas foi real, o importante é que vivi esse sonho e posso revivê-lo na minha cabeça as vezes que eu quiser e posso ir lá buscar forças durante o ano - garantidamente árduo - que se avizinha, quando elas começarem a faltar - o que irá, muito provavelmente, acontecer...
Mas isso basta-me, eu sou assim... No fundo, sempre me alimentei de sonhos (passados ou futuros) e, enquanto os houver, estou a salvo.
Foi preciso fazer 200 km para recuperar o fôlego, para renovar a esperança, para reatar a minha paixão pela Medicina...
Como era bom que tantas outras coisas se resolvessem com 200 km...
sexta-feira, setembro 17, 2004
Recado
Não, J.F., não me esqueci do post prometido. Mas ando profundamente desinspirada, cansada, desmotivada, nervosa, e um pouco farta de tudo. Peço-te apenas paciência.
quarta-feira, setembro 01, 2004
Sem que "hajam" novos dados...
Não sou pretenciosa ao ponto de achar que não cometo erros gramaticais ou utilizo sem mácula todas as construções frásicas. Mas também não me chamo José Rodrigues dos Santos nem sou Directora de Programas de Informação da RTP1. Além disso, começo a irritar-me com as perguntas pouco inteligentes que a maioria dos pivots de televisão faz nas entrevistas. Ultimamente, já só gosto do Mário Crespo (esse é delicioso!), do José Adelino Faria e do Carlos Fino; a Conceição Lino também já deixa saudades, no Hora Extra, onde estava no seu melhor.
Outsider
Entrei no autocarro. Validei a senha, como de costume, naquele gesto distraído e automático. Sentei-me num dos bastantes lugares vazios. O percurso, em direcção a casa, é um dos que faço repetidas vezes.
Mas, desta vez, fui tomada por uma sensação de estranheza e repúdio pela minha cidade. Talvez me devesse envergonhar de o sentir, mas a honestidade sentimental obriga-me a confessá-lo: repúdio. Senti que podia renegá-la, sentir-me estrangeira a ela e a ideia fez-me esboçar um sorriso. É pena que essa não-familiaridade vá durar pouco...
Mas, desta vez, fui tomada por uma sensação de estranheza e repúdio pela minha cidade. Talvez me devesse envergonhar de o sentir, mas a honestidade sentimental obriga-me a confessá-lo: repúdio. Senti que podia renegá-la, sentir-me estrangeira a ela e a ideia fez-me esboçar um sorriso. É pena que essa não-familiaridade vá durar pouco...
quarta-feira, agosto 18, 2004
De partida
Parto com o corpo mais pesado (no carro levo ainda um folar de 2 kg encomendado na Padaria Macedense e um queijo de cabra caseiro) e a alma mais leve.
Escrito a 16 de Agosto de 2004
Sexta, 13
Não me carimbaram todas as folhas como era pedido nas Instruções (espero não ter problemas quando as entregar para receber a caução).
Cheguei atrasada para buscar o F. à estação de camionagem.
Planeámos ir a Podence, à Casa do Careto, mas atrasámo-nos e desistimos por já não irmos a tempo. Fomos, então, ao Azibo. Nas pressas de tirarmos apenas algumas fotografias e imprimir na retina a restante paisagem que a objectiva não consegue abarcar, estacionei o carro em paralelo com o passeio, não o travei devidamente, não engatei a mudança. Quando procurei fixar novamente o carro, no regresso, o lugar estava vazio. Uns metros mais abaixo, lá estava o Golf, enfaixado na vedação...
Em seguida, fomos jantar ao Maria Rita. Não tínhamos dinheiro e lá não tinham Multibanco. Fizemos cerca de 11 km até Mirandela e outros tantos na volta para podermos pagar o jantar.
Finalmente, a noite acabou num barzinho sobre o Tua. Conheci o P.. Até nem sou supersticiosa com o 13, mas depois destas peripécias todas, só espero que ele não se venha a converter em mais um dos azares desse dia.
Enfarte com vista para a Praça dos Segadores
Peço uma caneta emprestada para escrever no meu caderninho (que foi comprado propositadamente para esta viagem, com as dimensões adequadas para caber no bolso da bata, mas que acabou por se tornar no suporte de papel onde escrevo os posts que publico a partir dos computadores do Espaço Internet cedido pela Câmara...).
Espero que me sirvam o jantar. É curioso, foi aqui que jantei na primeira noite em que cheguei a esta terra. Esta semana tenho sentido um aperto no peito, que começou de forma insidiosa, é intermitente, irradia para a alma, agrava à medida que o regresso se avizinha e não tem posição antálgica. Não consigo deixar de o sentir, mas tenho-o mantido controlado. Não quero que este sentimento de saudade antecipada me embote os sentidos. Quero experimentar tudo, até ao último momento. Não lido bem com despedidas, é verdade ("Parting is such sweet sorrow...", como dizia Shakespeare), mas também não tenciono despedir-me do Nordeste Transmontano. Pretendo dizer-lhe somente um até já...
O meu jantar chegou. A noite afigura-se longa: ainda tenho que voltar ao Hospital e depois sigo para a discoteca de decoração egípcia (hoje, com direito a sessão de strip).
Escrito a 12 de Agosto de 2004
segunda-feira, agosto 09, 2004
Férias do quotidiano
Agrada-me a ideia de estar num lugar em que ninguém me conhece; ou, por outra, em que ninguém conhece a minha história. Esse anonimato biográfico imprime outro ritmo aos meus passos. Não que tenha algum episódio escabroso a esconder. Simplesmente me fascina o facto de eu não saber nada sobre ninguém e o inverso também ser verdade. Gosto de olhar para os vários rostos e nenhum me ser familiar. Aqui existe efectivamente a possibilidade de voltar a nascer (será que é uma questão de lugar ou de tempo?).
quinta-feira, agosto 05, 2004
Fragmentos
AVC de repetição. Relatório de TC abdomino-pélvica novamente em falta. Arritmia. Febre escaro-nodular. Massa de bacalhau. Piropos de emigrantes franceses (suíços?). IP4. Casa dos Távoras. Rio Tua. IP4. Café na esplanada. Passeio pelo largo da Câmara, entre a fonte luminosa e as brincadeiras da miudagem.
Fases
A lua em quarto-minguante e a minha paz em quarto-crescente.
Acho que poderia viver aqui. Se bem que os lugares sagrados não são para habitar; são para visitar. Nunca os devemos conhecer totalmente. Julgo que aí deixam de ser sagrados...
Acho que poderia viver aqui. Se bem que os lugares sagrados não são para habitar; são para visitar. Nunca os devemos conhecer totalmente. Julgo que aí deixam de ser sagrados...
Fotografia incriminatória
Houve um rancho na praça. E trajes tradicionais. E acordeão. E as palmas do público a acompanhar. Não fosse o meu ímpeto citadino de posteridade - freeze-framing do momento em máquina fotográfica digital - e teria feito parte da multidão.
quarta-feira, agosto 04, 2004
Causa-efeito
Tenho sentido muito, o que cria muita matéria para moldar em palavras. Mas esta terra deixa-me entre o silêncio e a agrafia. Muito poucas coisas na vida têm este efeito sobre mim.
Terra Quente
Vim de viagem. Sozinha. Mas não, a solidão não veio comigo. E curiosamente, numa terra onde não conhecia ninguém, vim encontrar uma conhecida que já não via há 5 anos. Nem que trouxesse a solidão comigo ela teria forçosamente que partir. Mas não. Embora num lugarejo desconhecido, Trás-os-Montes tem invariavelmente o mesmo efeito sobre mim: lava-me a alma. Faz-me sentir segura. Não sei se é o abraço sólido das montanhas, se é o calor que aquece até os cantinhos mais recônditos da alma, se são as gentes humildes e afáveis. Sei que na viagem de volta vou com a alma transparente. E desta vez estava escrito que viria aqui encontrar o meu futuro. E eu acredito. Mas a volta ainda está longe... Felizmente.
terça-feira, julho 27, 2004
Boas e más companhias
Outro dia, a propósito de uma viagem que farei brevemente, sozinha, perguntavam-me se não me afligia a falta de companhia.
Não, a solidão não me aflige. A solidão é uma boa companhia. Nunca chega demasiado cedo (as outras companhias é que, por vezes, partem antes do tempo). Nunca é inoportuna - ela aparece quando tem que aparecer. Ela é verdadeira e altruísta (vem por nós, para nós, sem qualquer outra motivação). A solidão entrega-se a nós por inteiro, fica connosco noite e dia, se necessário, até ao ponto de se tornar a nossa solidão.
Uma companhia assim pode, adicionando-lhe longas porções de tempo, converter-se em algo insuportável. Podemos cansar-nos dela como de tantas outras coisas na vida que se tornaram rotineiras. Mas aí a culpa continua a residir em nós. A solidão vai-se quando tem que ir, porque não é preciso mandá-la embora; se entretanto arranjarmos outra companhia ela parte sem fazer escândalos, sem se sentir preterida e é certo que voltará para nós na devida altura.
Não. A solidão não me aflige. A mim o que me aflige são as más companhias.
Não, a solidão não me aflige. A solidão é uma boa companhia. Nunca chega demasiado cedo (as outras companhias é que, por vezes, partem antes do tempo). Nunca é inoportuna - ela aparece quando tem que aparecer. Ela é verdadeira e altruísta (vem por nós, para nós, sem qualquer outra motivação). A solidão entrega-se a nós por inteiro, fica connosco noite e dia, se necessário, até ao ponto de se tornar a nossa solidão.
Uma companhia assim pode, adicionando-lhe longas porções de tempo, converter-se em algo insuportável. Podemos cansar-nos dela como de tantas outras coisas na vida que se tornaram rotineiras. Mas aí a culpa continua a residir em nós. A solidão vai-se quando tem que ir, porque não é preciso mandá-la embora; se entretanto arranjarmos outra companhia ela parte sem fazer escândalos, sem se sentir preterida e é certo que voltará para nós na devida altura.
Não. A solidão não me aflige. A mim o que me aflige são as más companhias.
sábado, julho 17, 2004
Clínica de um sentimento - fim
Por não saberes palpar (as rochas), parou a bomba que ejecta as palavras através da grande circulação dos poemas e da circulação dos sentimentos ainda pequenos. O sal secou na parede dos vasos. Na minha boca entreaberta ficou uma alga misturada com grãos de areia.
As ondas do meu cabelo deixaram de se enrolar no vento.
Devido à tua inépcia no exame físico, morri na praia.
As ondas do meu cabelo deixaram de se enrolar no vento.
Devido à tua inépcia no exame físico, morri na praia.
sexta-feira, julho 16, 2004
SMS
Fui apanhada de surpresa com as novidades do blogger (acho que foram para melhor!).
Também gostava de ser surpreendida na minha vida (algo do género daquele anúncio já um pouco antigo do Impulse "E se um estranho lhe oferecesse flores?" não era mau...), mas aí continua tudo na mesma...
Enfim, também já estou hipoglicémica e não consigo escrever nada de jeito... Vou almoçar! Até logo!
Também gostava de ser surpreendida na minha vida (algo do género daquele anúncio já um pouco antigo do Impulse "E se um estranho lhe oferecesse flores?" não era mau...), mas aí continua tudo na mesma...
Enfim, também já estou hipoglicémica e não consigo escrever nada de jeito... Vou almoçar! Até logo!
Pink kisses
quarta-feira, julho 14, 2004
Clínica de um sentimento
Soubesses tu auscultar o mar e palpar cada contorno das rochas e talvez diagnosticasses os segredos que as ondas do meu cabelo contam quando se enrolam no vento...
segunda-feira, julho 12, 2004
Escrever
Estou desapacientada! Sim, desapacientada e sem nenhuma preocupação com a escolha da palavra que fica melhor na frase. Escrever. Freneticamente. Mecanicamente. Relógios moles!... Surreal é a minha impaciência! Estou farta deste cheiro a tempo passado que inunda o quarto! A janela empenou. Até o papel onde escrevo asfixia. Só me apetece escrever, não escrever nada, escrever tudo, escrever qualquer coisa com ou sem nexo. Sinto um desejo animal de escrever pelo simples prazer de escrever. Escrever, assim, sem preocupações parnasianas, com o pensamento desligado, sem qualquer tipo de correcção formal, lógica. Escrever sem querer saber se sou eu a criadora e o escrito a obra, se sou eu que escrevo ou se é o meu outro Eu a escrever, sem sequer me interessar pela qualidade da escrita. Unicamente o acto. Olho pela janela. A noite reclama originalidade. O relógio marca a hora da Quase-Mudança. Eu, só quero paciência!
sexta-feira, julho 09, 2004
E a morte perderá o seu domínio
E a morte perderá o seu domínio.
Nus, os homens mortos irão confundir-se
com o homem no vento e na lua do poente;
quando, descarnados e limpos, desaparecerem os ossos
hão-de nos seus braços e pés brilhar as estrelas.
Mesmo que se tornem loucos permanecerá o espírito lúcido;
mesmo que sejam submersos pelo mar, eles hão-de ressurgir;
mesmo que os amantes se percam, continuará o amor;
e a morte perderá o seu domínio.
E a morte perderá o seu domínio.
Aqueles que há muito repousam sobre as ondas do mar
não morrerão com a chegada do vento;
ainda que, na roda da tortura, comecem
os tendões a ceder, jamais se partirão;
entre as suas mãos será destruída a fé
e, como unicórnios, virá atravessá-los o sofrimento;
embora sejam divididos eles manterão a sua unidade;
e a morte perderá o seu domínio.
E a morte perderá o seu domínio.
Não hão-de gritar mais as gaivotas aos seus ouvidos
nem as vagas romper tumultuosamente nas praias;
onde se abriu uma flor não poderá nenhuma flor
erguer a sua corola em direcção à força das chuvas;
ainda que estejam mortas e loucas, hão-de descer
como pregos as suas cabeças pelas margaridas;
é no sol que irrompem até que o sol se extinga,
e a morte perderá o seu domínio.
Dylan Thomas
Considera-o uma espécie de tributo ao teu avô, H.. E lembra-te também da dedicatória que te fiz no "Platero y Yo"...
Nus, os homens mortos irão confundir-se
com o homem no vento e na lua do poente;
quando, descarnados e limpos, desaparecerem os ossos
hão-de nos seus braços e pés brilhar as estrelas.
Mesmo que se tornem loucos permanecerá o espírito lúcido;
mesmo que sejam submersos pelo mar, eles hão-de ressurgir;
mesmo que os amantes se percam, continuará o amor;
e a morte perderá o seu domínio.
E a morte perderá o seu domínio.
Aqueles que há muito repousam sobre as ondas do mar
não morrerão com a chegada do vento;
ainda que, na roda da tortura, comecem
os tendões a ceder, jamais se partirão;
entre as suas mãos será destruída a fé
e, como unicórnios, virá atravessá-los o sofrimento;
embora sejam divididos eles manterão a sua unidade;
e a morte perderá o seu domínio.
E a morte perderá o seu domínio.
Não hão-de gritar mais as gaivotas aos seus ouvidos
nem as vagas romper tumultuosamente nas praias;
onde se abriu uma flor não poderá nenhuma flor
erguer a sua corola em direcção à força das chuvas;
ainda que estejam mortas e loucas, hão-de descer
como pregos as suas cabeças pelas margaridas;
é no sol que irrompem até que o sol se extinga,
e a morte perderá o seu domínio.
Dylan Thomas
Considera-o uma espécie de tributo ao teu avô, H.. E lembra-te também da dedicatória que te fiz no "Platero y Yo"...
quinta-feira, julho 08, 2004
Afinal...
a promessa não se cumpriu (será que tinha sido feita por algum político?!). Felizmente, no entanto! A vida bem que nos troca as voltas... Mas sabe bem, chegar ao fim de um dia que tinha bastante para correr mal e constatar que os prognósticos estavam errados. É a prova de que também se pode apreciar um dia perfeitamente banal.
E viva a fruição da banalidade!!
Claro que o dia ainda não terminou e pode sofrer uma inesperada reviravolta!...
E viva a fruição da banalidade!!
Claro que o dia ainda não terminou e pode sofrer uma inesperada reviravolta!...
quarta-feira, julho 07, 2004
Sort of pink
Hoje consegui escapar à injecção sub-tóxica diária daquilo que não ouso sequer nomear, graças ao Milan Kundera (quer isto dizer, por outras palavras, que o dia não começou nada mal!).
Decidi contrariar aquilo a que ontem apelidei de "a negação da minha pessoa". Pode ser que ter a decisão, assim, escarrapachada no blog, tenha mais força que mantê-la somente em pensamento.
E agora, depois de uma viagem anestésica pela blogosfera (há blogs que vou descobrindo e dos quais me vou tornando fã e que brevemente adicionarei à minha lista de links) - pelo menos aqui a incursão é garantidamente cor-de-rosa - volto ao trabalho...
P.S.: F., seu desgraçado, ainda não me adicionaste aos teus links!! Boa viagem para Lx e depois falamos.
Decidi contrariar aquilo a que ontem apelidei de "a negação da minha pessoa". Pode ser que ter a decisão, assim, escarrapachada no blog, tenha mais força que mantê-la somente em pensamento.
E agora, depois de uma viagem anestésica pela blogosfera (há blogs que vou descobrindo e dos quais me vou tornando fã e que brevemente adicionarei à minha lista de links) - pelo menos aqui a incursão é garantidamente cor-de-rosa - volto ao trabalho...
P.S.: F., seu desgraçado, ainda não me adicionaste aos teus links!! Boa viagem para Lx e depois falamos.
sábado, julho 03, 2004
Insolucionável
Tenho um problema de Arquitectura para solucionar.
O que é deveras preocupante porque essa não é a minha área e não entendo de desenho geométrico. Descobri um erro de projecto num edifício de longa data e cuja solidez nunca pus em causa. A questão talvez seja estupidamente fácil para ti, mas enferma do facto de seres parte do problema, o que te exclui da solução. Passo a explicar melhor: hoje apercebi-me do mal que é construirmos os nossos pilares num terreno fora de nós mesmos, mais especificamente, no terreno que constituem os que nos são próximos... Creio que também nasce aqui uma contenda legal, isto de construir em terreno alheio e sem autorização prévia (mas, de momento, preocupa-me a questão "arquitectónica")...
Apercebo-me da inconsciência na realização do projecto, mas pergunto-me por que é que isto tinha que acontecer logo agora que o meu edifício tem sofrido abalos sucessivos, como é possível?, sempre pensei que se o topo ruísse ficaria, pelo menos, a fundação. Hoje sei que essa crença não passou de um equívoco. E sinceramente não sei como solucionar a questão. Estou com um nó algures entre a cabeça e o coração e não consigo sequer oxigenar suficientemente as palavras. Não percebo de Arquitectura, mas qualquer um sabe que uma construção não pode manter-se erguida sem alicerces.
Resta-me re-equacionar tudo. Parece que vou ter que voltar à estaca zero. Tenho que tornar-me pilar e edifício. Suspeito é que já não vou a tempo de entregar o projecto dentro do prazo para executar a obra.
O que é deveras preocupante porque essa não é a minha área e não entendo de desenho geométrico. Descobri um erro de projecto num edifício de longa data e cuja solidez nunca pus em causa. A questão talvez seja estupidamente fácil para ti, mas enferma do facto de seres parte do problema, o que te exclui da solução. Passo a explicar melhor: hoje apercebi-me do mal que é construirmos os nossos pilares num terreno fora de nós mesmos, mais especificamente, no terreno que constituem os que nos são próximos... Creio que também nasce aqui uma contenda legal, isto de construir em terreno alheio e sem autorização prévia (mas, de momento, preocupa-me a questão "arquitectónica")...
Apercebo-me da inconsciência na realização do projecto, mas pergunto-me por que é que isto tinha que acontecer logo agora que o meu edifício tem sofrido abalos sucessivos, como é possível?, sempre pensei que se o topo ruísse ficaria, pelo menos, a fundação. Hoje sei que essa crença não passou de um equívoco. E sinceramente não sei como solucionar a questão. Estou com um nó algures entre a cabeça e o coração e não consigo sequer oxigenar suficientemente as palavras. Não percebo de Arquitectura, mas qualquer um sabe que uma construção não pode manter-se erguida sem alicerces.
Resta-me re-equacionar tudo. Parece que vou ter que voltar à estaca zero. Tenho que tornar-me pilar e edifício. Suspeito é que já não vou a tempo de entregar o projecto dentro do prazo para executar a obra.
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